Horas Insólitas por Pama Loiola

Na solidão me encontro e me atordoo.
O momento é cravado de medo, há a angústia da morte
na incerteza da próxima inspiração.
Entoa o canto daquele sopro.
O silêncio fala comigo.
Até quando?
E tem o vento e tem
a luz na janela, e tem ela em seu leito.
E tem a máquina que respira sua vida. E tem o inimigo vil
do lado de fora.
E tem minha mãe
viva. E tem minha mãe morta. Viva.
Morta. Viva.
Tempos de pandemia.
Que inimigo é esse que tenta me invadir por inteiro,
me quebra em pedaços e me leva a um exílio covarde?
Que inimigo é esse que silencioso me rouba
a mãe, os planos,
o ar?
Horas insólitas.
No meu refúgio busco respostas em vão.
Recorro então à minha arte, a uma outra respiração.
O meu processo se dá em momentos de solidão
e isolamento, pequenos mundos
de pandemia.
Recolho sobras e pedaços
De descartes e componho novas formas.
Com objetos sem propósito faço do momento presente minha arte.
A chaga revela que vida não tem propósito.
O presente tem propósito.
Aos poucos recomponho
A mim, compondo-me em um quebra-cabeça.
A arte tem sua ação renovadora e não se prende seus respiros
Ela precisa ser imediata.
O processo de produção da obra “Horas Insólitas”
Um vídeo simples, sem preocupação técnica, que ilustra bem o meu processo. Entre a energia do momento criativo e a culpa de explorar como tema, a pré-morte de minha mãe surgiu uma ideia. Eu precisava dar forma a ela e só tinha um celular e uma câmera Powershot.
Queria gravar o movimento causado pelo vento na cortina do quarto e cadenciado com os impulsos do respirador artificial. Várias horas e diferentes momentos do dia, dentro de um hospital. A pandemia que eu vivi.
Pama Loiola
Abril 2020
Realização e produção:
Pama Loiola
Curadoria:
Lucila Vieira
Martha Mendes
Revisão:
Caio Machado
Newton Gmurczyk
Edição e legenda:
João Chimentão